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Vidas supérfluas?

Artigo Pe. Nadai - C. Popular 10/09/2013

10/09/2013

Assisti, recentemente, ao filme Hannah Arendt.

Hannah Arendt (Barbara Sukowa) e seu marido Heinrich (Axel Milberg) são judeus alemães que chegaram aos Estados Unidos como refugiados de um campo de concentração nazista na França. Para ela a América dos anos 50 é um sonho, e se torna ainda mais interessante quando surge a oportunidade de cobrir o julgamento do nazista Adolf Eichmann para a The New Yorker. Ela viaja até Israel, e na volta escreve todas as suas impressões e o que aconteceu, e a revista separa tudo em 5 artigos. Só que aí começa o verdadeiro drama de Hannah: Ela mostra nos artigos que nem todos que praticaram os crimes de guerra eram monstros, e relata também o envolvimento de alguns judeus que ajudaram na matança dos seus iguais. A sociedade se volta contra ela e a New Yorker, e as críticas são tão fortes que até mesmo seus amigos mais próximos se assustam. Hannah em nenhum momento pensa em voltar atrás, mantendo sempre a mesma posição, mesmo com todo mundo contra ela.

Trata-se de um filme “cabeça” como dizem os jovens. Faz pensar. Coloca-nos diante de graves e sérios questionamentos sociais e existenciais de ontem, o nazismo e de hoje, a banalização e descartabilidade da vida de milhões de pessoas.

Esta questão é debatida durante todo o filme com muita paixão de modo veemente e envolvente. Entre um cigarro e outro, entre uma pausa de reflexão e rápida retomada da ação; em meio aos diálogos noturnos com seu marido e debates acadêmicos com seus colegas professores da Universidade e embates com seu editor que a contratou como jornalista para cobrir o julgamento de Adolf Eichmann em Jerusalém, Hannah Arendt, pronuncia com toda força e indignação esta sentença: Os judeus foram deportados, condenados aos campos de concentração e mortos nas câmaras de gás porque foram considerados supérfluos e descartáveis.

Talvez esta afirmação de Hannah Arendt sobre o holocausto de milhões de judeus, porque consideradas vidas supérfluas, possa até ter passado desapercebida para a maioria dos que viram o filme, na avalanche das falas e acaloradas discussões.

Para mim, porém, não foi assim. Senti-me golpeado por esta afirmação tão categórica. Porque? Certamente porque tal sentença, tem tudo a ver com a realidade de nossos dias.

Somos, por acaso, todos supérfluos e descartáveis?

Todos não. Alguns são mais supérfluos que outros. Depende de sua condição social, de seu poder aquisitivo, de sua capacidade de produção. Se dá lucro ou não e assim vai. Em nosso país são milhares as pessoas em situação de rua, especialmente nas grandes cidades como São Paulo, Rio. Também em Campinas nos defrontamos com esta dolorosa realidade. Ainda setecentos municípios do Brasil não têm assistência médica e setores corporativistas posicionam-se contra as medidas que estão sendo tomadas com o programa Mais Médicos.

Em algumas regiões da África, são milhares de pessoas e famílias inteiras com suas crianças, amontoadas nos campos de refugiados. Como não nos indignarmos diante de milhões de pessoas que morrem de fome num mundo de tanto desperdício de alimentos?

Dói fundo ver jovens caídos ao chão e crianças apavoradas, correndo não se sabe para onde, nos ataques com armas químicas na Síria. Já são 100 mil vítimas do conflito e milhões de refugiados e fugitivos da guerra. A situação só poderá piorar se ocorrer intervenção militar dos Estados Unidos e aliados, como aconteceu no Afeganistão, Iraque e Líbia.

O Papa Francisco dirige à Igreja Católica e aos homens de boa vontade, um veemente apelo de Paz na Síria. “Dirijo um forte Apelo pela paz, um Apelo que nasce do íntimo de mim mesmo! Quanto sofrimento, quanta destruição, quanta dor causou e está causando o uso das armas naquele país atormentado, especialmente entre a população civil e indefesa! Pensemos em quantas crianças não poderão ver a luz do futuro! Condeno com uma firmeza particular o uso das armas químicas! Ainda tenho gravadas na mente e no coração as imagens terríveis dos dias passados! Existe um juízo de Deus e também um juízo da história sobre as nossas ações aos quais não se pode escapar! O uso da violência nunca conduz à paz. Guerra chama mais guerra, violência chama mais violência.” (01/09/2013)

Tendo diante dos olhos essa situação de vidas humanas ainda hoje dilaceradas é que me golpeou a fala sobre a descartabilidade da Vida Humana no Filme “Hannah Arendt”.

Com tristeza verifico que estamos longe, muito longe, do desígnio de Jesus de Nazaré que todos tenham vida e vida em abundância. Esta é a nossa esperança.

Pe. José Arlindo de Nadai – Paróquia Divino Salvador

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